segunda-feira, 31 de outubro de 2022

Ep. 2 - Um plano infalível

 Não demorou muito e precisei deixar a casa dos meus pais. Não sabia para onde ir ou a quem recorrer. Certo era que voltar a morar com eles não seria possível, uma vez que meu "eu do passado" já ocupava aquele espaço físico. Desci as escadas e o relógio já marcava 8:13. Em 4 de setembro, Brasília exibia sua conhecida beleza depois de um longo período de seca. O calor era forte já no início da manhã e o ar estava carregado com fumaça de queimadas. Por outro lado, ipês floridos alegravam o dia. Mas naquele momento, minha única preocupação era em como me segurar por três anos até o fim da missão.


Bloco A da 409 Norte

Caminhei em direção à banca de revistas. De relance, avistei alguns conhecidos que, em 2025, já não mais estavam entre nós. Evitei o contato. Por outro lado, ao passar pelos pilotis do bloco A, um jovem apressado me deu um esbarrão. Negro, de estatura mediana, sorriso marcante e uma mecha branca no cabelo. É claro que o reconheci de imediato. Edgar, vulgo Edgambá ou Neguinho, estava deveras atrasado para sua aula. O diálogo foi rápido:


- Edgar?, perguntei.


Ele não me olhou e disse apenas:


- 'Tô' atrasado.

Edgar e eu em 2020


Edgar sempre foi um grande amigo. Ele é alguns anos mais novo que eu. Quanto éramos crianças, a gente acabava aprontando algumas peripécias juntos. Sempre tínhamos um plano infalível para tudo, seja para ganhar em alguma brincadeira ou apenas para tomar alguns bonecos do Comandos em Ação de outras crianças. Coisas da infância. O fato de sermos tão amigos durante toda vida me fez ter uma ideia. “Oras, vou ficar aqui e esperar Edgar voltar. Ele saberá como me ajudar”, pensei.


Fiquei ali sentado em um dos bancos da quadra. Passei a manhã toda relembrando os planos para que a missão alcançasse sucesso. Aproveitei aquelas horas para lembrar do meu futuro. Deixei Zizou e Amélie aos cuidados de minha namorada. Ela, que apesar de ser contra minha viagem no tempo, me apoiou de imediato devido à causa. Com todo carinho e atenção, recordei-me, ela me disse quando fui designado para a empreitada:


- Se não tivermos por quem ou pelo que lutar, a vida nunca valerá a pena.


Essas palavras não saem da minha cabeça. A missão precisa ser cumprida, mesmo depois de um equívoco meu que a tenha atrasado por três anos.


Já passava das 12h30 quando Edgar retornou. O chamei e, agora, ele parou para conversar comigo. Eu tentei explicar rapidamente quem eu era, mas ele resistia à ideia. Me questionava se eu não era um estelionatário ou um charlatão querendo sua atenção ou um prato de comida. Até que tive uma ideia que mudaria o rumo da prosa. Lembrei de um episódio que vivemos na infância. Episódio esse que confirmou meu apelido de Ninja.


Acho que deveríamos ter entre 12 e 13 anos. Brincávamos no estacionamento entre os blocos D e F. Eu gostava do Jiraiya e, naquele momento, queria ser um ninja. Daí, comecei a espalhar que eu era ninja. Tudo que a gente ia fazer, eu falava que “o ninja tá aqui”. Edgar foi se "emputecendo" com aquilo e em um desses momentos ele apelou. Pegou sua sandália rider e em um movimento rápido a atirou contra meu rosto. A distância entre nós dois não chegava a um metro e meio e mesmo assim consegui me esquivar daquele ataque devido ao meu reflexo de ninja. Outros amigos presenciaram o fato e, assim, meu apelido de Neco Ninja se consolidou.


A partir daí, as coisas mudaram. Edgar, que sempre tinha um plano infalível para tudo, me chamou para subir e almoçar. Só que ele não poderia contar aos pais e irmãos quem eu era. Então, sugeriu que eu mudasse o nome e me tornasse o “instrutor de jiu-jitsu” dele. Ele queria me chamar de Sebastião, mas eu não gostei, apesar de meu avô ser Sebastião. O problema desse nome são suas variações, além, é claro, de ser nome de gente com mais de 70 anos. Entre essas variações, me incomodam Bastião, Tião e Sebá. Edgar concordou e, então, decidimos que eu me chamaria Luke, como o jedi.


Natal de 2019. Zezinho e eu

Subimos e eu já estava com bastante fome. O Zezinho, pai do Edgar, abriu a porta. Logo, reclamou:


- Pô, Edgar, você traz amigos pra cá sem avisar?


Edgar explicou quem eu era e que eu precisaria ficar alguns dias com ele. O Zezinho não se opôs. Homem de grande caráter e coração, logo pediu para eu me sentar e começar a almoçar. Estava tudo caminhando bem, até que em meio a uma conversa descontraída, eu solto uma informação perigosa:


- Então, Faísca, obrigado por tudo isso que está fazendo por mim. Sou muito grato.


Ele parou de comer, olhou para mim e respondeu:


- Você me chamou de que?


Eu não sabia onde colocar a cara. Zezinho tinha um irmão e os dois foram apelidados de Faísca e Fumaça quando jovens. Apelido esse que ele nunca gostou e que pouquíssimas pessoas tinham conhecimento. O clima pesou e ele insistiu no questionamento. Eu me apressei para engolir e pedi licença. Ao sair, pensei comigo: “Pô, tu és burro ou o que? O cara te dá comida e abrigo e você caga tudo”. De volta à estava zero. Na casa do Faísca, ops, Zezinho, já não posso ficar.


Continua...


segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Ep. 1 - Um encontro com o passado

O ano é 2025. O país se transformou em um caos absoluto depois que o resultado das eleições não contemplou um dos candidatos. Após o encerramento da votação, pequenos grupos armados insurgiram em diversas partes. Ao que tudo indica, a ação foi orquestrada e planejada com muita cautela anteriormente. Com todas as fragilidades do sistema, o braço forte do Estado ficou ao lado do perdedor das urnas e, com isso, fomos obrigados a resistir. E foi desta maneira que surgiu a Resistência.


Em meio ao caos, essa Resistência reuniu parte da classe trabalhadora – que também saiu dividida do processo – e profissionais liberais de diversos segmentos. Servidores públicos, jornalistas, advogados, escritores, filósofos, cientistas... Todos se viram obrigados a pegar em armas, ao mesmo tempo em que dedicaram seus esforços para combater o que deveria ser combatido. Em resumo, estamos há pouco mais de dois anos nas trincheiras, enfrentado aquele que deveria nos proteger. Mas algo vai mudar... E tudo passa por tecnologia.

Meteoro corta o céu de Goiás em 2022

Em abril de 2022, um meteoro cruzou o céu de Goiás, provocando um clarão e surpreendendo moradores. O que a imprensa não noticiou à época é que parte da rocha interestelar tocou o chão e que o governo a capturou. Esse pedaço do Cosmo trouxe consigo uma substância desconhecida. Cientistas que até então trabalhavam para o governo tiveram acesso ao material, que tinha um aspecto gelatinoso de cor azul petróleo predominante e algumas falhas em branco e preto. Um desses cientistas, que se alinhou à Resistência após ser perseguido junto com sua família, roubou parte da amostra.


Dos estudos com o “alienígena”, conseguiram encontrar uma maneira de quebrar a barreira do espaço/tempo, possibilitando, assim, um teletransporte na linha temporal. Nossos cientistas, então, construíram uma máquina movida pela substância, que de tão poderosa era capaz de colocá-la em funcionamento com apenas uma gotícula. Mas para que tudo ocorresse, não se podia viajar nela apenas uma pessoa. Eram necessárias duas. E para complicar ainda mais o processo, as duas precisavam ter pensamentos e desejos antagônicos ao ponto de não haver qualquer possibilidade de concordância. Era o equilíbrio universal fazendo sua exigência para que o homem pudesse romper essa última barreira do conhecimento.


Sim, a viagem ao tempo se tornou possível, mas com os perigos e as particularidades que uma nova tecnologia oferece.


Como tínhamos alguns prisioneiros sob nossa custódia, poderíamos colocar um plano ousado em prática: evitar que o conservadorismo chegasse ao poder. Com conhecimento histórico e in loco (cresci em Brasília na década de 1990), fui designado para cumprir a missão. Quando nos preparávamos para o início da operação, nossa base foi atacada. Tiros, bombas, lança-chamas... era um caos generalizado. Foi nesse momento que me empurraram para dentro da máquina junto com o adversário. Uma pequena quantidade da matéria alienígena foi rebocada na porta. Nesse momento, tive que apertar rapidamente o dia, o mês e o ano desejado: 04-09-1999. A porta se fecha e na correria e desespero, erro a digitação e clico 04-09-1996.


Barulhos, luzes apagando e acendendo, além de uma turbulência são percebidos. Só quando tudo se acalma, percebo o equívoco na data selecionada. A porta se abre e me deparo com a portaria do Bloco C da 209 Norte, quadra vizinha a que eu morava na década de 1990, a 409 Norte. Meu companheiro de viagem corre assim que a porta se abre e eu, ainda confuso, tento me recompor do que acabara de ocorrer.


Família na década de 1990

Meu primeiro pensamento foi: “errei. Agora, preciso ficar aqui durante três anos para cumprir a missão. Espero que o tempo não me faça esquecer o propósito disso tudo”. Saí devagar da portaria e vi a quadra de esportes em que jogávamos time contra com os amigos da 209. Muitas lembranças saltaram naquele momento.


Era cedo, a madrugada se rompia, dando início a um novo dia. Curioso, caminhei pela calçada entre as árvores de jamelão e manga. Passei pela banca de revistas e cheguei ao estacionamento do prédio em que meus pais moravam. O Bloco F continuava feio, precisando de uma grande reforma, o que ocorreria décadas depois daquele dia. Parei entre as vagas para os carros e olhei para a janela do apartamento 107. Nele, moravam nossos vizinhos que passaram a compor nossa família. Ouvi a voz da Mercedes conversando com o Resende. A luz da cozinha ainda estava acesa. No apartamento de cima, o 207, moravam meus pais.

Eu e meu sobrinho, em 1997

Ainda no estacionamento, procurei o carro do papai – uma Elba em cor azul claro perolado. A encontrei ao lado de outra Elba, uma de cor verde escuro (de propriedade do Resende). Estavam ali, como sempre estiveram durante anos. Me perguntei se poderia subir para ver meus pais. Como, aos 45 anos, eles me reconheceriam? Além disso, como explicar o fato de ser filho deles se na verdade eu estava dentro da casa deles com 16 anos? A minha situação não era boa. Mas, por algum motivo, queria vê-los. Meu pai havia falecido em 2022, quando eu já tinha 42 anos.


Tracei um plano. Comprei flores no comércio da 209 e, assim, simulei uma entrega. Toquei o interfone do apartamento 207. Uma voz muito conhecida atendeu:


- Pronto!, disse a voz da minha mãe.

- Entrega para dona Lázara, respondi.

- Sobe!, ordenou ela.


Eram 32 degraus ao todo divididos em quatro escadas. A cada passo, um pensamento diferente passava pela minha cabeça. Subi devagar e ajeitando o capuz do meu casaco. A porta estava entreaberta. Notei, no canto entre a porta e a parede do corredor, o piso antigo em taco. Eis que a porta se abre:


- Meu filho, o que fazes aqui?, questionou minha mãe.

Nessa hora, fiquei assustado, pois não passava pela minha cabeça que ela me reconheceria.

- Oi, mãe. Vim fazer uma visita. Trouxe flores, afirmei.


Ela me abraçou e me puxou para dentro. Em um dos sofás, meu pai sentado via TV. No outro, meu irmão estava deitado. Minha irmã não estava em casa naquele dia.


Era uma situação estranha, mas curiosa. Eu estava na minha casa, mas não me sentia em casa e estava louco de curiosidade para me ver aos 16 anos. Ao que tudo indica, eu ainda estava dormindo no mesmo quarto que dividia espaço com meu irmão. Mas sem pestanejar, disse que tinha “coisas” novas para eles. Retirei da minha bolsa uma caixa de som (estilo JBL) e comecei a explicar o funcionamento via rede wi-fi. Em 1996, nem computador nós tínhamos em casa. Internet era coisa que havíamos ouvido falar.


- Mas como isso é possível?, questionou meu pai.


Eu não sabia como explicar. Tentava dizer que era uma tecnologia nova, mas que ainda não havia se popularizado. Ao mesmo tempo, queria correr no quarto para me ver. Nas duas tentativas de ida, meu irmão me enxia de novas perguntas e eu não avançava em direção ao corredor que dava acesso ao nosso quarto. Sem muito sucesso, acabei por perceber que estava fugindo ao foco da missão. Por outro lado, pensava como eu ficaria três anos naquele mundo até a data desejada para o cumprimento dessa missão? Bem, com certeza muita coisa há de ocorrer nesse período. Por ora, caberia a mim me reinventar nessa sociedade “ultrapassada” que tanto me deu e me fez ser o que eu sou. E essas aventuras até o grande dia ainda serão contadas. Mas não hoje.



Continua...


quinta-feira, 23 de setembro de 2021

O Vagão

Andei por horas
Por dias
Por meses
Por anos

Um dia, meu
criador cansou
O fogo pegou
e queimado estou

Ah, seu eu pudesse trilhar
Um novo caminho,
um novo destino
Um novo lugar



segunda-feira, 6 de setembro de 2021

Sentir e sentir

A gente não pede para sentir
porque o sentir é momentâneo, é espontâneo
Só que no meu sentir, há muito de ti
e eu me pergunto:
É mais fácil sorrir ou agredir?

Assim como numa alvorada
o meu sentir se renova na madrugada
Deixando para trás tudo que
não faz bem, que estraga

Se um dia tu me agredistes, relaxa
depois de uma noite triste, tudo se encaixa
Agora, se preferistes sorrir
Obrigado! Certeza que vou retribuir

Nesse jogo, eu vivo um dia de cada vez
sempre me aventurando e tentando ser feliz
Porque na matéria do coração
eu sou um eterno aprendiz



quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

A vida é um risco

Sair de uma posição confortável para se arriscar ao desconhecido. Não fosse essa inquietação, essa coragem de desbravar, a humanidade jamais teria chegado até onde estamos nesse momento. A evolução do planeta Terra, e da própria humanidade, pode ser replicada em uma escala menor, dentro de nós mesmos. A nossa vida é um emaranhado de estradas e cabe a cada um de nós escolhermos por qual delas seguir.


Fico a imaginar nosso planetinha em sua origem. Aquela confusão cósmica e cada qual se acotovelando para garantir uma órbita segura e estável. E por quantas e inúmeras vezes nos pegamos dessa mesma forma, galgando espaços em busca de uma situação confortável, seja ela na escola, na faculdade ou na profissão? É um momento de muito atrito, de muitas descobertas e, claro, de muita perseverança.

Depois de garantida essa órbita estável, era hora de olhar para si mesmo. Nosso planeta, então, começa a se resfriar. Milhares e milhares de anos se cuidando e permitindo-se moldar ao ponto de se tornar atraente, habitável. É o que fazemos ali por volta das 30 anos. Já não somos mais crianças e, até essa idade, já vivemos histórias interessantes e de pura formação. Temos, em outras palavras, o couro grosso, o pelo duro. Estamos testados e prontos para algo maior.


A vida, então, passar a ser vida. As maravilhas das cores, dos perfumes e das belezas naturais abrem caminho para a chegada do Amor. O homem passa a transitar confiante entre os seus. A Terra, agora, já tem nome. Não é apenas um planeta, mas está nominada pelos seus habitantes mais sabidos. A maturidade leva à ciência dos atos, à leveza das decisões e também à dureza das responsabilidades. Sim, “tu te tornas eternamente responsável por aquilo ou aquele que cativas”. É o homem deixando de ser criatura e passando a tomar conta de seus próprios passos.


Segue-se o curso da vida. Você está pronto para entender um pouco mais dos mistérios que cercam nossa existência. A busca constante por respostas o leva a buscas inimagináveis aos seus antepassados. O caminho certo não é mais o horizonte, mas sim as estrelas. E, assim, tu passas a compreender as tuas origens. Entendes todo processo que esse planetinha passou para ter o que de melhor tu podes ter: condições de vida. Então, não a desperdice!

quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

É tempo de amar

Os dias passam...
A distância aumenta...
Os anos se vão...
Na lógica desse espaço/tempo
O amar ainda não se perdeu não

Palavra simples não é amar
Ao contrário, vira rama.
Rama que brota do peito, da alma
Que busca sem nenhum receio
Pelo que lhe dá combustão: o seu coração.

Mas amar não é ato isolado
Não se ama sozinho
O amar exige transição, doação
Assim como Cristo o fez
Em sua transubstanciação

"O mar vai virar sertão
E o sertão vai virar mar"
"O mundo vai acabar"
Dessas muitas profecias, uma última não poderia faltar:
No tempo certo, eis que voltaremos a nos amar

Ederson Marques



quinta-feira, 3 de outubro de 2019

Madrugada de um pseudo-detetive escritor do futuro

Um stradivarius tem quatro cordas e um som inconfundível. Ele também oferece quatro oportunidades e uma série de lembranças, algumas suaves e outras brutais. Com esse estalo na memória, comecei a rever o Xangô de Baker Street pela madrugada. Em cada cena, lembrei-me dos tempos de faculdade e de cada folha vencida do romance rabiscado por Jô Soares. E sorrisos me acompanhavam com as deduções do então brilhante detetive Sherlock Holmes e as “coisices” do Dr. Watson.

Imaginem que, lá pelas 2 horas da madrugada, eu já começava a tramar aventuras e situações que levassem o detetive britânico a gastar boa parte de seus neurônios para tentar descobrir o que seria meio óbvio aos olhos de um bom brasileiro. E aí os delírios começaram.

Havia uma moça muita bela, cheia de virtudes e destemida, adorada por todos que a cercavam. Essa moça tinha uma voz encantadora, um sorriso largo e falava quatro idiomas fluentemente, o que facilitava sua comunicação em todos os recintos que frequentava. De cabelos lisos, cor de mel, olhos castanhos e pele rosada, não passava despercebida. No entanto, apesar de todas as suas qualidades e beleza, sofria por causa do machismo enraizado na sociedade.

Holmes, galanteador como suponho deveria ser, não pode deixar de se encantar por esta moça logo no primeiro encontro dos dois. O perfume adocicado da bela mulher o deixara tão arrebatado que momentaneamente perdera quatro dos cinco sentidos humanos. Nesta hora, apenas o olfato lhe dominava e o fazia lembrar dos dias quentes em um café às margens do Rio Sena no verão parisiense. A fragrância lhe era familiar, mas o nome lhe fugia à memória toda vez que tentava recordar. Holmes só voltava de seu êxtase quando Watson o cutucava com sua bengala de marfim.

Nesses devaneios, pensei que a tal moça escondia em meio a sua radiante luz um pouco de trevas, que em determinados momentos a dominava. E nesses momentos, a encantadora poderia tramar e executar planos tão mirabolantes que dariam calafrios até mesmo em João Grilo, o maior arquiteto de mentiras que já existiu em terras tupiniquim. Mas quem desconfiaria dela? Quem poderia acusa-la de algo nocivo? Quem teria a audácia de suspeitar de uma criatura?

Eu só consegui pensar em uma pessoa: Dr. Watson. O médico tende a ser, por si só, mais racional e menos propício aos dispersos sentimentos. Apenas Watson suspeitaria que de um corpo tão incrivelmente talhado pelo Criador saltariam forças tão obscuras. Ele também imaginaria que uma pessoa que dominava quatro idiomas tinha intelecto suficiente para ludibriar toda uma sociedade.

Antes de dormir, porém, imaginei algumas boas situações em que esse trio poderia se esbarrar. Sempre tendo a virtuosa moça como a executora de tramas impossíveis de serem descobertas por Holmes, que vivia enfeitiçado pela beleza e cheiro de tal graciosidade. Holmes seria, então, presa fácil. A única solução seria colocar Watson como o salvador de tudo, mesmo que os louros ficassem sob a renomada fama de Holmes. Ainda voltarei a escrever sobre esse trio. Ah, eu volto!

quinta-feira, 2 de maio de 2019

Meias para que te quero


Stormtroopers nas canelas
Faz um tempinho que não escrevo por aqui. Seria cômodo dizer que estou sem tempo, que a vida está uma correria, blá blá blá... A verdade é que estava apenas sem saco mesmo para escrever. Talvez a “imbecilização” e superficialidade do debate estritamente político nas redes sociais tenham tirado meu tesão por escrever algumas linhas. Mas como fugir disso, depois de 17 anos trabalhando com isso? Ah, sei lá!

Gosto de meias. Em especial, meias com estampas. As uso bastante para treinar e isto já é quase uma marca registrada. Os comentários são diversos. Há pessoas que gostam, outras acham exageradas. Fato é que minhas meias nunca passam despercebidas, seja em Brasília ou Curitiba.

Das que eu tenho, gosto bastante de uma cuja estampa é do King Kong. Esta é quase sempre elogiada. Por outro lado, tem uma do Jason que causa reações não muito animadora nos brutos e nas brutas. Eu vou me divertindo com essas reações. Muita gente me pergunta onde compro minhas meias. Oras, compro onde encontro. Feiras, shopping, rua... Sempre aparece uma meia legal no meio do caminho.

Mestre dos mestres
A última preciosidade que comprei é estampada pelo mestre dos mestres do Kung Fu: Bruce Lee. Só de olhar para a meia sinto minhas forças crescerem em uns 10%. É coisa de louco a capacidade psicológica que essas coisas exercem em nós. Se estou bem e me sinto bem, a força vem.

Com esta constatação, acredito que meus recordes pessoais devam crescer nas próximas semanas. Vou anotar todos e volto para publicar cada aumento de PR. Vai ser legal. A Vessel Crossfit que me aguarde nos próximos dias. 

Meias do Motörhead para competir
Esqueci de mencionar que elas me salvam também de vez em quando. Outro dia, esqueci de colocar meias sociais na bolsa de treino. Terminada a ralação, depois do banho, percebi que teria de usar um terno com meias estampadas. Até que não ficou muito feio, mas que o povo não parou de me zoar o dia todo, isso é verdade. O que importa, no fim das contas, é que meias são sempre divertidas e coloridas. Ah, e sobre política... Blá blá blá!!!
Meias dos Beatles em pleno Salão Verde da Câmara

segunda-feira, 8 de outubro de 2018

Quem esse lazarento pensa que é?

Alguns telefonemas e trocas de farpas em grupos de Whatsapp. Assim teve início o contato com esse ucraniano direto, sem frescuras, meses antes da decisão sobre minha vinda para Curitiba. De estatura privilegiada, ele não passa despercebido por onde chega e tem uma vontade de fazer a coisa funcionar tão grande quanto eu tenho. Abro esse humilde espaço para escrever sobre o Juvino Grosco, o maior parceiro que o trabalho no Paraná poderia me arrumar.

Certo dia, em Brasília, eu percebo um cara fazendo uma live atrás da outra na página de um dos nossos clientes. Mando mensagens no grupo pedindo para parar porque o efeito seria ruim sem um planejamento prévio. Segundos depois, recebo uma resposta ríspida e direta: “Vamos continuar fazendo”. Eu expliquei sobre o algoritmo usado pelo Facebook e a resposta seguinte foi ainda mais direta: “Você deveria conhecer mais de Paraná”.

Pouco tempo depois, recebo a notícia de que deveria embarcar para o Paraná e ajudar na campanha do Sérgio Souza. Nosso planejamento era mostrar o que ele tinha feito para centenas de municípios e, então, sobrou para a dupla Ederson/Juvino percorrer boa parte do Estado fazendo entrevistas e imagens. E aí eu pensei: “Caracas, Juvino é complicado, mas vamos lá”. Eu estava totalmente errado. Nada de complicado. Em primeiro lugar, ele conhece esse Paraná como poucas pessoas e, depois, o Paraná o conhece. Em cada município que pisávamos, prefeitos, vice-prefeitos e lideranças nos recebiam de forma carinhosa. Todos conheciam Juvino e demostravam muito respeito por ele. Isso me chamou atenção.

Os dias foram passando e a amizade e o respeito aumentando. Chegou a campanha. Não consegui ajudar Juvino em quase nada. O plano era eu estar na rua com eles, fazendo boa parte das postagens nas redes sociais, mas o trabalho exigiu outra frente de atuação e fiquei na base. De longe, rezava pela segurança deles nas estradas (nem sempre boas e algumas muito perigosas) e me esforçava para atender de imediato qualquer demanda. Incrível a capacidade e dinamismo do Juvino. Ele não deixou nenhuma reunião sem publicação. Algo incrível!

Eu sempre fazia questão de repetir para quem quisesse ouvir, sem medo algum de cometer qualquer injustiça, que Juvino carregou a campanha de rua nas costas. Um trator para trabalhar esse ucraniano que, segundo a Débora Weiller, "tem até olhos azuis".

Terminamos esse processo, meu amigo, e saiba que tens um grande amigo em Brasília que te admira, respeita e não mais vai discutir contigo ao telefone. Até porque tenho certeza de que, assim como eu, você já deve ter a resposta para aquela pergunta que tanto nos fez rir neste processo todo: “Quem esse lazarento pensa que é?”

Obrigado pela amizade da sua família. E que o Gui seja tão foda quanto você, meu velho.


segunda-feira, 4 de junho de 2018

Descamisado: Tem coisas que só acontecem...


Os dias vão passando e as crônicas vão saltando. Poderia escrever sobre várias coisas que ocorreram no fim de semana frio de Curitiba. Do tal do Murph (tô com o corpo doendo até agora, dois dias depois) até a visita rápida da Soraya Lacerda. Mas é melhor eu contar algo inusitado aos meus seis leitores. Sou botafoguense e disso todos vocês já sabem. Conhecem aquela frase? Tem coisas que só acontecem com o Botafogo! Pois bem, ela poderia ser facilmente adaptada a mim.

Era domingo. Me programei para lavar a roupa na lavanderia comum do condomínio que estou morando. Por volta das 14h, subi ao terraço e percebi que não tinha ninguém na frente da danada. Olhei para um lado e depois para o outro, só para ter certeza. Desci correndo e peguei minhas roupas. Subi com sabão em pó e com o amaciante assobiando uma música do Manu Chao. Tudo no esquema!

Abri a boca da bicha e coloquei tudo lá dentro: camisa, short, bermuda, cuecas, meias... Estava salvando minha semana no trabalho e no Kahu Crossfit, afinal precisava de roupas limpas para a semana. Fiz tudo como manda o manual de uso daquela belezura que lava até 10kg. Coisa linda de Deus. Era esperar por volta de duas horas e subir novamente para recolher as cheirosinhas. Pois bem, lá pelas 15h25 meu interfone tocou. Era a síndica:

- Senhor, vi pelas câmeras de segurança que o senhor colocou roupas para lavar, né?

- Sim, coloquei e já estou subindo para retirá-las.

Aí que o bicho pegou. A síndica disse, com voz tensa:

- É que tivemos um probleminha aqui e preciso da sua presença agora.

- Fodeu! Pensei logo. Eu fiz tudo certo. O que poderia dar errado? Subi pelas escadas mesmo. Do primeiro para o sexto andar. Cheguei e encontro uma mulher bufando e com os olhos vermelhos. Até eu ficaria. Um frio danado e tenho de sair de casa para resolver problema de máquina de lavar?

O problema foi o seguinte. O tambor daquela beleza cedeu. A máquina parou e travou a porta. Tentei abrir de qualquer forma, em vão. Só pensava: Que bosta. Com que roupa vou treinar e trabalhar? A síndica informou que o técnico só poderia ir arrumar na terça-feira e que, até lá, minhas roupas ficariam presas na máquina. Desci desolado, desconfiado e só pensando como seria.

Abri o guarda-roupas para ver o estrago. Restaram três cuecas, uma calça jeans, duas camisas sociais e três camisetas, além de duas bermudas de surfista. Ah, o terno ainda estava lá, mas hoje mesmo o levei para a lavanderia. Sábado preciso estar no Rio de Janeiro para um casamento. Espero que até lá eu consiga ter ao menos uma cueca limpa.

Tem coisas que só acontecem com o Botafogo... E comigo!

sexta-feira, 1 de junho de 2018

Curitiba, seja gentil e surpreendente

Não é fácil ou simples deixar o conforto de lado e se aventurar em águas desconhecidas. O novo assusta, causa estranheza e te faz ter novas sensações e sentimentos. Há cinco dias, desembarquei em Curitiba para uma temporada. O frio do clima me recepcionou, mas a famosa frieza do paranaense foi o que mais me causou arrepios.

Com muito orgulho, posso dizer que conheço um pouco desse Brasil. Curitiba é a 21ª capital em que coloco meus pés. Na bagagem, a vontade de desenvolver um bom trabalho e de abrir o leque de possibilidades. E, por isso, a importância de se correr com novas amizades. Nesse quesito, busquei logo a comunidade que tem a mesma vibe que eu: crossfiters.

Já na segunda, fui ao Kahu Crossfit para uma aula experimental. Espaço bacana, aparelhos bacanas, motivação mil... Resultado: uma hora de treino ouvindo apenas a voz do coach. "Como assim? Aqui ninguém conversa, reclama das dores, xinga pelo cansaço..." Foi aí que me toquei da tal frieza do paranaense. Não é exagero. Eles mesmos reconhecem isso. Cheguei a entrar em outro box, mas pela logística do trabalho, me matriculei no Kahu. Foi uma decisão acertada. Explico.

Na terça-feira, retomei o treino às 7h - mesmo horário em que fazia no meu querido Vessel Crossfit, em Brasília. A turma desse horário no Kahu tem muitos iniciantes e, assim, tive mais espaço para conversas e brincadeiras. As amizades, então, começaram a fluir. Flávia, Maria Fernanda, Diego e o Felipe, que já até morou em Brasília. Questionei sobre essa frieza toda e eles riram. Disseram: "Não é porque somos metidos. A gente simplesmente é assim. Você vai entender com o tempo". Eu, dado como sou e cheio de conversas, disse: AMÉM.

Na quarta-feira, já estava no grupo do zapzap da galera. Ainda como um estranho no ninho, mas tentando notar as particularidades de todos, fui seguindo. Pela noite, me chamaram para um barzinho famoso pela pizza e chopp gelado. Como tudo aqui fica perto da minha casa, fui caminhando e voltei de Uber pela segurança. Noite agradável e de amizades consolidadas.

No feriado, o treino me surpreendeu. Marcado para 10h30, às 10h25 éramos apenas o coach, a Quinha e eu. Do nada, como se fossem uma bateria de escola de samba executando o recuo, chegam umas 15 pessoas e a coisa rendeu. Nesse treino específico, vi que o paranaense não é tão frio assim e que a estada aqui será muito agradável e promissora.


São apenas cinco dias de uma nova jornada. Ainda vou percorrer essa terra ao lado do Juvino por algum tempo. Espero que a acolhida que tive no Kahu se repita em outros lugares. Como diria um amigo: "Deus no comando e coragem na cara. O resto acontece".

Ep. 2 - Um plano infalível

 Não demorou muito e precisei deixar a casa dos meus pais. Não sabia para onde ir ou a quem recorrer. Certo era que voltar a morar com eles ...