“O problema das pessoas é que o mundo evoluiu e já se passou da modernidade, atingindo um estágio pós-moderno capaz de descaracterizar toda e qualquer intenção de se fazer o bem”. A frase foi pronunciada antes das 7h de uma quinta-feira em algum lugar da capital da República Federativa do Brasil. O adolescente, que acordara cedo de mau-humor, ficou pensando naquilo enquanto esperava por um pão quente na chapa.
Estranho despertar para um ser que ultimamente só se preocupa com espinhas, futebol, iPod e uma possível paixão em sua escola. Mesmo assim, enquanto saturava seu leite de Todd, resolveu se aventurar em desvendar o que tal frase significava naquele momento. O avô, que acordou um pouco mais tarde, por volta das 7h20, foi pego de surpresa ao ser questionado sobre o que havia mudado tanto que atrapalhava as pessoas a fazer o bem. Meio acordado, meio dormindo, disse: “o dinheiro, a violência e o egoísmo”.
Em meados de 1960, um outro adolescente se deparava com questionamento parecido, mas nem tanto enigmático. “O que faz o homem voar e chegar à Lua? Eis a grande questão a ser resolvida pelo então jovem que hoje é avô. Passados 50 anos, cinco décadas ou duas gerações, se fala em pós-modernidade de uma forma estranha. O que é moderno já é ultrapassado? O pós-moderno é o futuro? Não sei.
A evolução da tecnologia com o uso massivo do computador, do celular, de veículos que estacionam sem condutor e outras tantas coisas estão no cotidiano do adolescente, que agora já saboreia seu pão feito na chapa. Com a boca cheia, fixando o olhar para o chão, deixa escapar: “Vocês não entendem nosso mundo. É diferente”.
Os avós ficam pasmos, mas concordam. Ora, quando tinham 14 anos não contavam com tanta tecnologia, que hoje é um mundo distante. Ligar um computador, mandar e-mail, twittar... Nossa, quanta coisa estranha. Mas o avô não perde tempo e começa a falar com neto.
- Sim, meu filho. Os anos passaram e nem sempre nós, que parecemos dinossauros em meio à extinção, acompanhamos sua evolução. Mesmo assim, tem algo que nem o tempo, nem o avanço tecnológico, nem nada pode mudar: o caráter de uma pessoa. Seja na pré-história, na época de Cristo, no mundo medieval, na Revolução Francesa, nas duas Guerras Mundiais, na modernidade ou nessa tal pós-modernidade, nada pode mudar a honestidade, a generosidade e a solidariedade de uma pessoa do bem. Fazer o que é bom sem olhar a quem. Isso ultrapassou os tempos e nunca será perdido, pois no coração do homem existe um “cômodo” cheio de carinho, amor e fraternidade. Nunca te esqueças disso e ajude a fazer com que essa mensagem não seja desvirtuada pela pós-modernidade.
O neto achou que o avô estava “viajando” naquele momento, mas sentiu algo em seu coração. O fruto de tal conversa só foi conhecido quase uma vida depois. No leito de morte, o neto, que agora se tornara avô de sete crianças, chama a esposa e pergunta em seu último sussurro de vida: “eu venci a pós-modernidade?” A esposa, que minutos depois se tornaria viúva, respondeu:
- Meu amor, em minha vida sempre vi pessoas querendo tirar proveito das outras. O jeitinho brasileiro foi algo presente nas rodas de amigos e também sociais. Ao te conhecer, notei que poderia haver algo diferente daquilo que eu havia vivido até ali. Exemplo de solidariedade, compromisso, dedicação e amor, você não só venceu a pós-modernidade, mas também o que vem depois dela e o que virá daqui há séculos. As palavras voam, mas os exemplos arrastam. E você arrastou uma família e duas gerações para darem continuidade à essa mensagem. Eu te amo!
Ao ouvir isso, o adolescente que comera aquele pão na chapa entregou-se ao destino da vida, certo de que os ensinamentos que aprendera com seu avô foram passados para outras gerações.